… Akuna xa lisima
Lexi tlulaka a lirandzo
Leli litlanganisaku vano
Va tixaka ta la misaveni
Akuna xa lisima
Lexi xitlulaka a timpswalo
Leli tlanganisaku vano
Va tixaka lani tikweni…
Foi assim que conheci os jovens Willy e Aníbal Matine, se a memória não me faz cair em teias de esquecimento, foi um pouco antes da independência, na então União Moçambicana da Cultura Musical e Teatral da qual eu era um dos líderes. Entre várias actividades que desenvolvemos na altura, posso destacar o apoio aos nossos músicos associados que animaram com as suas actuações os festejos da celebração da independência. E este duo também tomou parte dessas actividades.
As nossas relações, a nossa amizade e irmandade foram crescendo com o passar tempo. Quanto mais passava o tempo, maior era o laço que nos unia. Em 1976, quando se criou a Direcção Nacional da Cultura, dirigida por Gabriel Simbine e Rui Nogar, o destino colocou-nos, novamente, no mesmo palco de reencontro. Como dizia o poeta Vinícius de Moraes “a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida”.
Não havia muitos funcionários e nós éramos os “faz-tudo”, os homens de duas mãos que faziam imensas actividades. Com duas mãos mexíamos o mundo inteiro. Surge-me agora, à memória, o Aníbal conduzindo um machimbombo com essas mesmas mãos que hoje usa para tocar a sua viola. Prosseguimos juntos toda a jornada que praticamente nos tornou aqueles que podem ser considerados os primeiros funcionários da Cultura de Moçambique independente.
Trabalhei com cada um deles, lado a lado, em muitas e variadas tarefas até ao momento em que todos fomos ocupar a cadeira de reformados. Fizemos a estrada juntos durante 40 anos.
A dupla Willy e Aníbal Matine tem um percurso que vem desde antes e pós-independência e tem um espaço cativo na história das artes moçambicana e nos corações de muitos moçambicanos amantes da boa música. Essa dupla tem um mural importantíssimo na história das nossas artes.
Compositores exímios com mensagens profundas e criteriosamente bem elaboradas, donos das vozes com uma sonoridade e harmonia que fazem das suas interpretações musicais incomuns. Por esses e mais motivos tiveram a honra de receber o Prémio de Melhor Voz Masculina do Ngoma, a maior competição musical a nível nacional promovida pela Rádio Moçambique. Aliás, eles honraram esse prémio, porque bons artistas não são honrados pelos prémios.
Como todos sabem, a música é uma das formas das expressões da cultura popular que exerce uma importante função na construção da identidade na sociedade. A sua importância já vem descrita pelos maiores pensadores da antiguidade, a começar pelo Aristóteles que disse que “a música é celeste, de natureza divina e de tal beleza que encanta a alma e eleva acima da sua condição” e Platão que deu um pequeno intervalo à teoria dos dois mundos e disse “primeiro devemos educar a alma através da música e a seguir o corpo através da ginástica” e eu reforço dizendo através da dança. Nietzsche rematou “sem a música a vida seria um erro”.
A luta, perseverança, estudo e a convicção são uma constante nas vidas dos gémeos Willy e Aníbal. Isso lhes fez galgar montanhas no esforço e na certeza de servir o bem-comum, mas carregando sempre as suas guitarras quais armas que portam balas com pólvora aromática de flores de Éden. E a música é arma e uma arma não pode ser enxotado do ombro do guerreiro, podemos invocar a mulata de Katembe, Noémia de Sousa, que diversas vezes, em versos sangrou no papel “tirem-nos tudo, roubem-nos tudo, mas deixem-nos a música”. Os gémeos resistiram e do alto da montanha sempre nos mandaram recados para conservar o amor. Esses são os mensageiros do amor, os cupidos armados de flechas de violas.
Aproveito a ocasião para apelar à sociedade, aos homens de boa vontade para que apoiem de diversas maneiras esta empreitada do Celebrando Vidas que tem como componente a valorização profissional das artes, a mais desvalorizada de todas as profissões.
HINKWERU HA RAMBIWA
Mas afinal quem são esses gémeos de que tanto se fala?
Willy Matine e Aníbal Matine nasceram no dia 28 de Maio de 1951, na província sul-africana de Natal onde os seus pais viviam. Depois, vieram para a então Lourenço Marques (hoje, Maputo) ainda muito jovens. Tiveram os seus primeiros ensinamentos na Igreja Wesleyana, onde o pai era um fiel servidor e tiveram como tutor e Pai Espiritual o famoso Maestro Goodvin Mata.
Aquele “Mestre Capela”, como era pitorescamente apelidado pelos seus discípulos, levantava-se de madrugada para escrever novas composições, ensaiava-as durante o dia e as comandava à noite. Assim, estes jovens que cresceram como prisioneiros enjaulados na música sacra, mal podiam adivinhar que um dia romperiam as grades da igreja e cantariam para os quatro cantos do mundo. Talvez tenha sido o espírito divino que lhes tirou do palco da igreja para os nossos palcos, para os palcos das nossas vidas. Cantaram e encantaram o país. Cantaram na Europa, como por exemplo: na antiga URSS, RDA e Jugoslávia. Cantaram na Bulgária, Roménia, Portugal; mas também cantaram pela África adentro como na Tanzânia, Cabo-Verde, Suazilândia e outros.
Que tipo de música é que os caracterizava? A pedra de toque da música dos irmãos Willy & Aníbal é o AMOR. O amor é a força motriz que lhes faz guerrear nos palcos, é a língua que tem em cada letra e em cada coro. Esta é a musa da filosofia musical dos Matines. Amor de mãe, amor à pátria, amor ao trabalho, amor ao próximo, enfim, tudo quanto seja amor parece excitar os nobres corações dos gémeos que teimam em interpretar as suas canções com auxílio de guitarras acústicas, apesar da invasão no mercado pelos mais sofisticados instrumentos electrónicos.
Abro aqui um parêntesis para dizer que chamá-los gémeos pode ser um erro. Eles são um só que se desdobra em dois, são um só que se funde numa única só voz. Esses não são gémeos, são uma única pessoa que anda disfarçada em duas. Como chamá-los gémeos, se nenhum deles existe sem o outro?
Willy & Aníbal revelaram-se, ao longo de mais de 40 anos de sua existência como um duo musical, talentosos e verdadeiros intérpretes das emoções do povo. As suas canções evocam um mundo romântico e sentimental e não só. Ao longo dos 40 anos mostraram que tudo pode esgotar na vida, menos a força de cantar o amor.
Que figuras amorosas poderiam ser rítmicas, mais verdadeiramente vivas, mais activas, mais melodicamente adequadas do que “NDRAVA YA MAMANA”, “MAVOKO” ou “XONGANI NWANYANA”? Essa impetuosa exaltação em tudo quanto é belo e amoroso encontra-se em quase todas as canções que constituem o acervo musical dos Matines.
Esta dupla encantadora, que é uma pessoa no fundo, com as suas melodias, faz-nos regressar as nossas almas às aldeias, às noites tranquilas e quentes de amor, com luar ou sem luar, mas sempre com estrelas cintilantes, em que dançávamos com o rufar de batuques num deleite genuíno e sem paralelo. E a sua música tem, também, essa função: a de nos transportar para onde já estivemos, para o nosso passado, para o nosso ontem onde chegamos apressados e vasculhamos as gavetas das nossas memórias cheias de restos de eventos do fomos um dia.
Como cota deles, aquele que também os ajudou noutras estradas da vida em jornada de tormentos, festivais, grandes concertos, viagens, enfim… orgulho-me
Eles tiveram um papel importante na edificação da Associação dos Músicos Moçambicanos e ainda hoje lá estão por força e vontade dos associados; eles colocaram as mãos na obra de construção da SOMA. Eles transportavam a força de servir que aprenderam na igreja para todos os cantos e eles merecem de mim e de todos o maior reconhecimento que se pode atribuir em vida. Parabéns irmãos Willy e Aníbal Matine, parabéns *Celebrando Vidas* e parabéns pelo exemplo de que devemos celebrar os nossos heróis em vida, porque amanhã poderá ser tarde para ouvir e receber os nossos aplausos.
Por hoje paro por aqui, porque Ni yamukelile papila dra Mamamana. Li tsandazataku mahungo lawa ya manene.
#David Abílio